Assim como pretende simplificar a reforma da Previdência, o governo federal estuda fazer o mesmo em relação à reforma tributária. Não se trata de fatiar a proposta. Em vez de criar um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) para reunir tributos da União, estaduais e municipais em um só – projeto em discussão no Congresso sob a relatoria do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) -, o plano alternativo em estudo prevê apenas dois tributos federais. Assim, a União arrecadaria da indústria apenas na saída do produto acabado e, do varejo, somente na venda ao consumidor final.
O ICMS permaneceria, mas PIS, Cofins, IPI, Cide e ISS seriam eliminados. “Esse novo imposto seria só da União. Não mexeríamos com os Estados, por enquanto”, diz o advogado Gastão Alves de Toledo, assessor especial da presidência da República. E tudo seria controlado por meio do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), que integra as notas fiscais eletrônicas.
Antes da produção, não haveria tributação para a indústria, mas o setor também deixaria de ter direito à compensação de créditos. Já a tributação do varejo seria partilhada com os municípios, para substituir o ISS. “E as prefeituras poderiam receber algum ‘plus’, se necessário para manter o nível atual de arrecadação”, afirma Toledo.
As alíquotas seriam repartidas em percentuais complementares para manter a arrecadação atual, mas concentrada. “Como seriam eliminadas todas as complicações inerentes ao sistema polifásico, a exemplo das compensações de crédito, que exigem das empresas manter equipes enormes para controlar isso, os custos dessas empresas devem cair, e essa queda pode chegar aos preços”, afirma o advogado.
A estimativa de alíquotas necessárias para a captação do mesmo montante arrecadado hoje, segundo Toledo, já está sob análise do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Instituto Atlântico e Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Tanto o Ministério do Planejamento como a Receita Federal já têm conhecimento da nova proposta em estudo”, diz.
Após percorrer o país em busca de apoio para a aprovação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC nº 31, de 2007) para reestruturar o sistema tributário do país, Hauly apresentou no dia 22 de agosto uma minuta sobre a PEC à comissão especial que estuda propostas para reforma tributária na Câmara dos Deputados.
O principal objetivo da PEC também é simplificar o atual sistema, mas, com a extinção de dez tributos (IPI, IOF, CSLL, PIS, Cofins, salário-educação, Cide-Combustíveis, ICMS e ISS), que seriam substituídos pelo IVA e o Imposto Seletivo. O IS incidiria sobre petróleo e derivados, combustíveis e lubrificantes, cigarros e outros produtos do fumo, energia elétrica, telecomunicações, bebidas, veículos automotores, pneus e suas peças. Ambos seriam arrecadados e fiscalizados por uma espécie de Super-Fisco, que reuniria os auditores fiscais da Receita e Secretarias da Fazenda estaduais e municipais.
Segundo Hauly, a proposta deve ser apresentada ao plenário da Câmara até o começo de dezembro. “Foram 121 palestras nesses últimos dez meses de trabalho, entre inúmeras reuniões e a aceitação da PEC é nacional pela diminuição da carga e simplificação tributária”, afirma o deputado. “Estive na quarta-feira com o presidente da República, que apoia a proposta”.
Para Hauly, a PEC deve passar por se tratar de um modelo conhecido, que funciona no mundo todo. “Negociei com todos os setores: indústria, comércio, agricultura, cooperativas, auditores fiscais da União, Estados e municípios…”, afirma. Segundo ele, a simplificação acabaria com a guerra fiscal, as renúncias fiscais – o que é bom para o governo -, e com o custo elevadíssimo da burocracia para controle das obrigações tributárias pelas empresas. “Além das despesas com o contencioso Judiciário e administrativo, que chegam a um terço do PIB”, diz.
Ambas as propostas precisam modificar a Constituição para dar competência à lei complementar posterior. Mas como 2018 é ano eleitoral e a proposta alternativa não envolveria os Estados, teria mais chances de ser aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Michel Temer. Conforme disse o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, em evento em São Paulo, há a chance de a reforma tributária passar a da Previdência na fila.
De acordo com o jurista Ives Gandra Martins, que também já participou de reuniões com o Ministério do Planejamento sobre a proposta alternativa, a PEC liderada pelo deputado Hauly é muito boa, mas difícil de passar no Congresso, em um fim de governo. “Os governadores dificilmente vão abrir mão da sua competência”, afirma. “O problema que vejo da proposta alternativa são os cálculos de projeção de alíquotas para não serem muito elevadas. Tudo vai depender da quantificação levantada”, diz.
Independentemente de qual for a proposta levada adiante, o diretor jurídico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Hélcio Honda, afirma que a reforma tributária é fundamental para a indústria, assim como a reforma trabalhista e a da Previdência. “Nosso sistema tributário está entre os mais complexos do planeta e a carga tributária, alta e regressiva, pune os consumidores”, diz Honda.
Segundo Honda, além de tornar o país mais atrativo, a simplificação do sistema tributário pode acabar com um contencioso tributário que leva, em média, mais de 15 anos para uma solução. “E, consequentemente, cria a necessidade de termos muitos programas de parcelamento, anistia, Refis, quando isso deveria ser absoluta exceção”, afirma.
Recentemente, o professor e jurista Marco Aurélio Greco, propôs uma alternativa adicional, apresentada no XXI Simpósio de Direito Tributário o Instituto de Estudos Tributários (IET), em Porto Alegre. O “simples setorial”, concentraria todas as incidências tributárias de determinados setores, de fácil fiscalização e grande arrecadação, em um recolhimento único. Ficariam submetidos ao “simples” setores como petróleo, energia elétrica e agronegócio. “Deixando o problema da repartição do arrecadado para os entes públicos, o contribuinte ficaria apenas com o ônus de pagar o tributo na hora devida”, disse.